14 de outubro de 2008

Sobre seios, silicone e filosofia


Bem, a ordem não vai ser exatamente aquela anunciada pelo título. Inverto a ordem dos prazeres e começo com a filosofia, que é bem menos aconchegante que o peito feminino, mas que também pode render alguns deleites.

Há quem ignora a influência grega sobre a atual sociedade, mas ela existe, profundamente enraizada no nosso modo de conceber o mundo. Não vou entrar em pormenores, apenas darei um exemplo periférico: perceba o jeito como cada um de nós se refere às partes do próprio corpo. “Minha” mão, “meu” pé, “minha” barriga... Usamos pronomes possessivos, como se essas coisas fossem propriedades. Mas, oras?!, propriedade de quem? Afinal, “somos” um corpo, ou “temos” um corpo?

Facilmente podemos concluir, hoje, que somos esse corpo que sofre a dor e goza o prazer. Somos esse corpo belo ou feio que reflete no espelho. Sendo assim, se somos esse corpo, porque dizer que ele é “nosso”? Aqui que entram os gregos. Um grego em especial: o Platão. Ele estava preocupado em resolver um problema que afligia seus contemporâneos: como explicar a mudança das coisas e, ao mesmo tempo, justificar a possibilidade do conhecimento? Por um lado, a observação mostrava que o mundo e as coisas estavam constantemente se transformando (tudo flui... ninguém entra duas vezes no mesmo rio – disse Heráclito) e, por outro lado, se se considerar que as coisas realmente estão em constante mudança, como poderíamos falar com conhecimento sobre elas? Se esse fosse o caso o nosso saber sobre o mundo estaria sempre desatualizado, pois quando achamos que compreendemos algo, aquilo já não é mais!

Pode parecer uma discussão trivial, mas foi decisiva para os rumos da civilização ocidental. Foi esse dilema que instigou Platão a desenvolver o seu sistema filosófico, baseado em dois mundos: o mundo das coisas sensíveis e perecíveis – o mundo que se tranforma, se altera – e o mundo supra-sensível – o mundo das coisas constantes, que não mudam. O mundo sensível, como o nome sugere, é composto por coisas acessíveis aos sentidos; tudo o que podemos sentir, tocar, ver e etc. Já o mundo supra-sensível é composto por idéias, por conceitos, que são as matrizes de tudo o que existe no mundo sensível. Com essa simples distinção de mundos Platão conseguiu fornecer uma resposta satisfaria ao problema do conhecimento e da constante transformação das coisas: as coisas mudam, sim, concorda ele, mas isso não é relevante para o conhecimento, pois este abrange as idéias, os conceitos, que pertencem ao âmbito das coisas eternas, que não se transformam. O rio nunca é o mesmo, suas águas não se repetem e nem seu leito se conserva o mesmo, mas, mesmo assim, podemos conhecer o que é um rio, pois nosso conhecimento não se refere a um rio sensível que se transforma a cada instante, se refere ao conceito-rio, à idéia supra-sensível de rio. Essa idéia não muda nunca!

[continua]


marcelo doro

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